A Fantasia - Por Roger Reis

A psicanálise é uma disciplina bem complexa, explorativa, analítica, reveladora e de autoconhecimento profundo, ela revela aspectos da nossa personalidade, da formação da nossa psiquê e repressões que nos moldaram durante nossa vida.

É uma técnica perceptiva e de escuta sensível, cujo objetivo principal é a compreensão das dinâmicas do inconsciente que moldam nossa personalidade e o comportamento humano. Entre as diversas faces desse campo, uma das estâncias psíquicas mais visitadas e essencial para nós seres humanos é a fantasia.

Neste artigo, pretendo explorar esse conceito tão importante e crucial na prática psicanalítica, entender seu significado e como ele influencia o processo terapêutico, tanto do analista, como do analisando, falaremos sobre esse aspecto tão fascinante que chamamos de “Fantasia”.

Não há como falar sobre fantasia sem falar sobre os aspectos duais e fundamentais da análise, pois estamos falando da fantasia, tanto do analista como do analisando, e dos aspectos pessoais intrínsecos de cada um.

 

 A Fantasia do analista

Comecemos pela fantasia do analista, que se refere à posição assumida pelo analista durante o processo de análise, esse foi um conceito desenvolvido por Sigmund Freud e posteriormente ampliado por psicanalistas como Jacques Lacan, entre outros.

A ideia de que o analista também é afetado pelo processo analítico, e que possuí suas próprias fantasias inconscientes que influenciam a forma como ele percebe e interpreta os conteúdos trazidos pelo analisando.

Essa fantasia, é fundamental em todo processo de processo da análise, em outras palavras, o analista não é uma entidade neutra e objetiva, mas está imerso em suas próprias vivências e experiências subjetivas, que podem influenciar a compreensão do material analisado, daí a importância do analista estar em análise e obter a neutralidade necessária, que consiste em não deixar seus conteúdos interfiram no processo analítico.

A fantasia do analista pode ser vista como um instrumento de trabalho, já que está ligada a imaginação e à elaboração do que se escuta, e pode ser utilizado de forma criativa e produtiva no processo analítico desde que não atrapalhe a atenção flutuante e observativa.

Ela envolve a capacidade do analista de reconhecer e refletir sobre suas próprias fantasias, desejos e preconceitos, a fim de evitar interpretações excessivamente pessoais ou distorcidas, e sim da compreensão mais precisa do material trazido pelo analisando.

Além disso, a fantasia do analista também pode ser entendida como a capacidade de se colocar no lugar do paciente, de imaginar e compreender o mundo interno do analisando a partir de sua própria subjetividade. Isso envolve empatia, intuição, atenção flutuante e uma capacidade de neutralidade muito afinada.

Resumidamente falando, a fantasia do analista refere-se à consciência do analista de suas próprias fantasias inconscientes e da habilidade de usá-las de forma reflexiva e sensível no trabalho analítico, buscando compreender e auxiliar o paciente em seu processo de auto exploração, transformação, ressignificação e pacificação com ele mesmo.

 

A Fantasia do Analisando

Já se falando da fantasia do analisando, é uma construção mental, uma projeção inconsciente do paciente sobre o psicanalista, que exerce uma representação simbólica na mente do analisando, essa representação é baseada em suas próprias experiências e desejos mais profundos, que origina-se de experiências passadas, relacionamentos afetivos ou mesmo aspectos da personalidade do analisando.

A influência que essa fantasia tem no modo como o paciente se relaciona com o terapeuta, e como ele experimenta o processo terapêutico, é fundamental no processo analítico, isso é chamado de transferência, fenômeno central na psicanálise.

O analisando projeta suas emoções, expectativas e desejos sobre o analista, essa transferência é uma manifestação da sua fantasia.  

O analista pode assumir diferentes formas na psiquê do analisando, variando de acordo com a história de vida e de suas vivências.

Alguns podem fantasiar o analista como uma figura onipotente e protetora, que irá resolver todos os seus problemas, outros podem projetar figuras parentais ausentes ou idealizadas, e é através da associação livre que iremos perceber essas transferências.

É ai que a neutralidade, a empatia, a escuta afinada, a sensibilidade e o manejo se fazem presentes e de suma importância.

Essas fantasias podem criar um campo emocional intenso na relação terapêutica, permitindo que o analista compreenda melhor os conflitos internos e as dinâmicas inconscientes do analisando.

Ao explorar e interpretar essas fantasias, o analista auxilia-o a compreender suas projeções e a desenvolver uma visão mais clara de si mesmo e de suas convicções.

O analista deve estar atento às manifestações transferenciais do analisando, buscando compreender as emoções subjacentes e os desejos ocultos por trás dessas fantasias.

Ao trazer à consciência essas projeções, o analista possibilita a análise e a transformação dos padrões inconscientes que limitam o paciente, e é através da associação livre que ele(a) tem a possibilidade de elaborar, ressignificar e transformar esses acontecimentos muitas das vezes traumáticos e limitantes.

Desempenhando um papel central na psicanálise, revelando a intricada teia de desejos, projeções, repressões, deslocamentos, e dinâmicas inconscientes que permeiam a relação terapêutica, a fantasia permeia todo o processo analítico, sem ela seria impossível se chagar à realidade.

Através da interpretação cuidadosa dessas fantasias, o analista e o paciente são capazes de explorar as camadas mais profundas da psique humana, permitindo o crescimento pessoal e a resolução de conflitos emocionais, mentais e traumáticos.

Convido você à essa fantasia que permeia nossa psiquê, e que aos poucos, nossa fantasia nos leve mais perto das nossas realidades.


Roger Reis - Psicanalista / Filósofo


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